Vinícius Guedes: estudar as imagens permite entender as mudanças na forma como a sociedade interpreta os acontecimentos

O docente atua na Linha de Pesquisa Estéticas e Narrativas e estuda temas relacionados ao fotojornalismo e narrativas por meio da imagem 

Arquivo Pessoal

O professor Vinícius Guedes Pereira de Souza é fotógrafo e jornalista há mais de 30 anos, e atuou por 15 anos no mercado de trabalho antes de voltar para a academia, em 2007, em seu mestrado como aluno especial do professor Boris Kossoy. Dando aula na graduação há 13 anos e na pós há 10, Vinícius já possuía experiência quando entrou como docente permanente no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Poder (PPGCOM), da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).

O professor realiza pesquisas constantemente, desenvolvendo-as principalmente em relação à imagem, seu maior objeto de interesse. Além deste, o docente também estuda questões relacionadas à comunicação e direitos humanos, jornalismo e fotojornalismo, documentário, mídias alternativas e memória e imaginário. 

Com o recente pós-doutorado, realizado entre 2021 e 2022, Guedes pesquisou as imagens e sua relação com fake news e com a mudança no modo de pensamento hegemônico da sociedade. A discussão em torno do tema também se liga à disciplina que atualmente ministra no PPGCOM, Disputas Narrativas no Audiovisual.

O professor a baseia em seus anos de estudo, desde o seu mestrado e doutorado em Comunicação pela UNIP, em São Paulo. 

“Eu sempre vejo uma importância social na temática da imaginação e das imagens, exatamente porque nós estamos tendo uma mudança na forma hegemônica de pensamento da humanidade. Nós estamos passando do que Flusser chamava de pensamento tempo-histórico-linear, pensamento baseado em textos, para o pensamento mágico-imagético-circular, baseado em imagens”, afirma o professor, destacando a importância do estudo implantado na área comunicacional. 

Arquivo Pessoal

Guedes é fundador e colaborador da MediaQuatro e do Jornalistas Livres, trabalhou para veículos como Estadão, Macworld, foi correspondente da Gazeta Mercantil nos Estados Unidos, e executou diversos projetos relacionados à fotografia na África, Ásia e America Latina. 

Ele também já foi professor no Centro de Estudos Latino-Americanos em Comunicação e Cultura (CELAC) na Universidade de São Paulo (USP), e coordena um projeto de pesquisa sobre a morte na mídia e como ela é retratada, em conjunto com o também professor do PPGCOM Pedro Pinto. 

Como pesquisador, trabalha há mais de uma década em sua pesquisa de fundo, “Realidades e Invisibilidades Midiáticas”, em que discute aquilo que existe porque é mostrado pela mídia, e o que as pessoas não sabem da existência, porque ela não mostra. Além disso, como resultado de um projeto de pesquisa de cinco anos, o professor escreveu o livro “Quer que Desenhe? Imagens, Fake News e Mudança no Modo de Pensamento”, publicado ao terminar o pós-doutorado. 

É sobre esse livro que a equipe do Tornar Comum conversou com ele na entrevista a seguir.

 

Tornar Comum: Quais foram os desafios na produção do livro?

Vinícius Guedes: O maior desafio na produção do livro foi harmonizar e retirar as redundâncias de vários textos publicados anteriormente, como artigo ou capítulo de livro coletânea. Quando escrevemos um artigo acadêmico ou capítulo de livro que será publicado isoladamente é preciso sempre contextualizar o assunto porque o leitor pode não estar familiarizado com o tema. Com isso, dentro de uma mesma pesquisa, é comum repetir argumentos ou até mesmo citações em textos diferentes. Mas numa obra que reúne esses artigos, o texto tem que correr como um só de capítulo em capítulo. Além disso, decidi por lançar o livro logo após o fim do pós-doutorado e acabei utilizando uma editora que já havia publicado outras obras minhas e da [minha esposa] Maria Eugênia para agilizar o processo, já que a publicação por uma editora universitária demandaria mais tempo e burocracia para aprovação dos textos. No final, foi uma boa ideia porque publiquei em 2023 uma segunda edição revista e atualizada, aí sim com o selo USP. 

Tornar Comum: Como você resume o argumento principal do seu projeto?

Vinícius Guedes: A pesquisa gira em torno da pergunta: estamos lendo os textos escritos como se fossem imagens? Essa pergunta é importante porque o argumento principal é que estamos mudando a forma de pensamento hegemônica da sociedade, do raciocínio baseado em textos (tempo-histórico-linear) para o raciocínio baseado em imagens (mágico-imagético-circular). O primeiro traz uma visão de mundo calcada nas causas e consequências, nos processos, no passado-presente-futuro, assim como é uma linha escrita. No segundo o olhar gira sobre as imagens (ou os blocos textuais) tirando de uma só vez o significado a partir de conhecimentos ou pré-conceitos anteriores. Como a grande força das imagens é o seu impacto emocional, muitas vezes turvando o raciocínio lógico, o pensamento mágico-imagético-circular é mais propício a utilizar os preconceitos que todos temos para manipular os sentimentos mais básicos como ódio, medo e desejo. Assim, ele é excelente para a disseminação e aceitação acrítica de fake news, por mais absurdas que sejam. E isso já no governo Lula. 

Tornar Comum: Como essa publicação se conecta com a sua linha de pesquisa no PPGCOM?

Vinícius Guedes: A criação e disseminação de fake news baseadas em falsas narrativas imagéticas tem tudo a ver com a linha de pesquisa Estéticas e Narrativas. Tanto assim que, já pela segunda vez, estou lecionando no PPGCOM a disciplina Disputas Narrativas no Audiovisual utilizando como base o livro. Afinal, entre os diversos cases analisados ao longo dos capítulos estão vários produtos audiovisuais, como documentários, a exemplo do “O Mercado da Notícia e Guerras do Brasil”, e pseudo-documentários como “A Facada no Mito” e as produções da Brasil Paralelo.

Tornar Comum: Pensando em futuros alunos do PPGCOM que se identifiquem com o tema do seu projeto, livro, que dicas você daria a elas? Qual seria o primeiro passo?

Vinícius Guedes: Ler muito e desconfiar de tudo. As imagens são sempre segunda realidade, ou seja são produções que dependem dos pontos de vista, opiniões e interesses de quem as produz e/ou distribui. Este semestre na disciplina, por exemplo, estamos analisando em conjunto as imagens, ações e repercussões midiáticas de conflitos produzidas por governos autoritários sobre ataques e atentados à bomba, como por exemplo as polêmicas quanto aos autores do ataque ao Hospital Batista na Faixa de Gaza.

 

Por Larissa Azevedo

Trabalho elaborado no âmbito do Projeto de Extensão Tornar Comum: Divulgação de Ciência em Comunicação e Poder.

 

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